A violência contra a pessoa idosa: Um fenômeno não tão novo assim…

Fernanda M. F. Augusto – Assistente Social

Desde 2006 a Organização das Nações Unidas (ONU) e a Rede Internacional de Prevenção à Violência à Pessoa Idosa (INPEA) instituíram o dia 15 de junho sendo o “Dia Mundial de Conscientização da Violência contra a Pessoa Idosa”, e a partir daí profissionais e serviços voltados ao atendimento dessa população, manifestam-se por meio de palestras e cartazes as formas de violência e quais os canais para denunciar. Partindo do pressuposto de que “consciência, cada um tem a sua” podemos somente educar a população sobre as maneiras violentas das relações e criar uma nova proposta de lidar com o outro diferente de mim ou que depende de mim, sem que seja um peso, incômodo ou ainda um confronto. O idoso em algumas sociedades é tido como inválido, incapaz, em outras, como líder, oráculo, e, nessa diferença são construídos olhares a respeito do que seria propriamente um ato violento, assim, o vínculo estabelecido entre quem as compõe também define o modo pelo qual posso ser agressor e vítima.

“É dever de todos prevenir a ameaça ou violação dos direitos do idoso” – Estatuto do Idoso

A violência contra o idoso é entendida como “um ato (único ou repetido) ou omissão que lhe cause dano ou aflição e que se produz em qualquer relação na qual exista expectativa de confiança”, sendo assim, o mau-trato é tido como um problema social que impede a vítima o acesso aos seus direitos, entre os quais de uma vida com qualidade e digna, quando é acometida por abusos psicológicos, físicos, sexuais, financeiros ou ainda pela ausência de cuidados. Quantos e quantos casos assistimos, lemos em canais de comunicação que expõem as piores situações de negligência a essa população. E o que fazer? Calar e resignar-se acaba sendo a mais rápida estratégia de saída para incômodo causado, afinal, se não sou uma vítima em potencial (enquanto idoso) poderei sê-la (enquanto adulto jovem)…

Paulinho da Viola, quando canta “meu pai sempre me dizia: meu filho tome cuidado, quando lembro do futuro, não esqueço o meu passado”, poetiza o encontro de gerações e tantos conflitos vividos e o que há por vir, sendo um futuro bom ou não, é importante a compreensão do quanto é importante o respeito entre as gerações, as pessoas e o principal, entre as histórias de vida. Certamente, tantos casos de abandono de idosos em instituições de longa permanência não são justificados, mas, servem de alarde a tantas discussões que se fazem acerca de como enfrentar os maus-tratos, que são cada vez mais reforçados pela ausência de programas e serviços que atendam de maneira rápida, eficaz e respeitosa às vítimas.

Em Abril / 2018 foi divulgado pelo site Agência Brasil[1],que no último ano o Disque 100 um dos meios mais utilizados para denunciar casos de violação de direitos humanos no país, registrou, “33.133 denúncias e 68.870 violações. Nas denúncias de violações, 76,84% envolvem negligência, 56,47%, violência psicológica, e 42,82%, abuso financeiro e econômico. A maior parte dos casos, 76,3%, ocorre na casa da própria vítima.”.

Dessa forma, atentar-se para de que maneira se dão as relações conflituosas antes mesmo de qualquer denúncia é fundamental, para isso, busque por orientação dos profissionais nos Centros de Referência Especializados de Assistência Social – CREAS, mais próximos da região, que trabalham com situações de violência, e certamente, qualquer posterior atitude será realizada de maneira mais cautelosa e cuidadosa.

[1] Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2018-04/disque-100-registra-142-mil-denuncias-de-violacoes-em-2017>  . Acesso em: 14 Jun.2018.

O dia em que se falou sobre morte no Centro Dia para Idosos Angels4U

Ana Maria Yamaguchi Ferreira

Psicóloga

 

Grupo de psicologia

No dia 03 de novembro de 2017, um dia depois do feriado de Finados celebrado no Brasil, ocasião que, segundo Jabocci (2017) se celebra e homenageia a memória dos mortos em diferentes países, optou-se por abordar o delicado tema da morte e do morrer no grupo de discussão da Psicologia do Centro-dia Angels4U. Seria oportuno tratar desse tema num momento tão “à flor da pele” de idosas e idosos que haviam revivido a perda de pessoas queridas no dia anterior? Essa pergunta estava no horizonte do como abordar de maneira delicada tema de cunho delicado. Preparou-se o grupo, como ocorre antes de toda atividade de discussão da Psicologia, por meio técnicas de relaxamento e introspecção, utilizando-se de música apropriada para a ocasião. Finalizado este primeiro momento do grupo, foram abordadas, dentre outras, as seguintes perguntas:

  1. Como vocês passaram o Dia dos Mortos? Como suas famílias costumam passar este dia?
  2. Como vocês lidam com a perda das pessoas queridas que se foram?
  3. Vocês pensam sobre a própria morte? Como seria?
  4. Como gostariam de ser lembrados quando se forem?

Em relação à primeira pergunta, o grupo teve a feliz participação humorada de um idoso muito longevo que entrou no tema, quebrando o gelo, dizendo que foi ao cemitério visitar os mortos, porém não encontrou ninguém. Tal resposta provocou o riso do grupo como um todo, possibilitando um ar bem-humorado e leve ao longo das perguntas que se seguiram. Existiram diferentes maneiras de se celebrar este dia no grupo: grande parte do grupo é composto pela etnia japonesa, muitos idosos e idosas eram católicos e outros, de religião budista. Por isso, tanto as manifestação brasileiras quanto as japonesas foram de celebrar a memória dos ancestrais foram perceptíveis, como por exemplo, a ida ao cemitério – comum no jeito brasileiro de celebrar tal data -, ou a oração feita no Butsudan, pequeno altar ou santuário doméstico de tradição budista.

Quanto à segunda pergunta, muitos haviam visitado o túmulo de parentes de graus mais distantes, ou mesmo de filhos falecidos. A pergunta que permeia o falar sobre a morte na chamada Terceira Idade pode ser a de como tocar no tema da finitude quando ele pode ser vivido ocultamente, sem ser expresso ou trabalhado por meio do falar, de reflexões e lembranças diárias sobre as perdas já vividas ao longo de uma vida longeva, que mais cedo ou mais tarde, se findará.

Então, veio a terceira pergunta ao grupo: como se imaginava a própria morte. Houve respostas das mais densas, ricas e variadas. Uma idosa, mais uma vez, provocou o riso dos frequentadores do Centro-dia, quando disse que não sabia, pois nunca havia conhecido alguém que voltou do lado de lá. Foram mencionadas também a ideia do Paraíso e Inferno, de cunho católico; bem como o lugar da morte como local para descanso da existência muitas vezes penosa; um local para se pensar se era necessário tirar os sapatos, costume japonês de adentrar o lar sem trazer sujeira do exterior, e um lugar de reencontro com as pessoas queridas que se foram antes.

A última pergunta feita ao grupo, suscitou o desejo e respostas de esperança quanto ao legado deixado quando partirem, como serem bem lembrados pelo sentimento de terem semeado coisas boas na vida.

Segundo Ferreira e Wanderley (2012), falar sobre a morte, tratada comumente pelos campos da Tanatologia e os Cuidados Paliativos, é tratar sobre um assunto que diz respeito à condição humana, pois esta diz respeito a todo e qualquer ser humano.

Quando se há marcas da morte, ao longo do tempo, nas falhas e fragilidade do corpo idoso, trazidas pela impermanência da vida, o tema sobre a própria morte pode ser vivido diariamente. É possível tornar tais pensamentos sobre a morte e o morrer menos angustiantes e tabus, ao se colocar por meio da expressão e elaboração verbal, aquilo que tanto toca o idoso e suas famílias, podendo haver inclusive o riso libertador entre uma pergunta e outra.

REFERÊNCIAS:

Ferreira, A.M.Y. & Wanderley, K.da S. (2012, agosto). Sobre a morte e o morrer: um espaço de reflexão. Revista Temática Kairós Gerontologia,15(n.º especial 12), “Finitude/Morte & Velhice”, pp. 295-307. Online ISSN 2176- 901X. Print ISSN 1516-2567. São Paulo (SP), Brasil: FACHS/NEPE/PEPGG/PUC-SP.

Jacobucci, N. Dia dos Mortos: celebrando as memórias. Disponível em 25/12/2017:<http://www.portaldoenvelhecimento.com.br/dia-dos-mortos-celebrando-as-memorias/>.

Santuários Japoneses – Butsudan e Kamidana. Disponível em 25/12/2017:<http://www.japaoemfoco.com/santuarios-japoneses-butsudan-e-kamidana/>

A insuficiência familiar: Reflexões a cerca da potencialidade de seus membros 1

Fernanda Maria Fávere Augusto – Assistente Social

old and young holding hands

Atualmente, o conceito de insuficiência familiar assume a característica de Síndrome Geriátrica e é considerada um dos sete gigantes da Geriatria. Levando à reflexões pertinentes ao cuidado e trato da pessoa idosa, em especial numa condição de fragilidade e/ou vulnerabilidade social, quando a família é considerada a principal e muitas vezes a única provedora e responsável por garantir direitos mínimos, humanos e dignos, tal qual preconiza o Estatuto do Idoso (2003), em seu artigo 3º: “É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária”.

Nesse sentido, colocando-a em primeiro plano é de maneira implícita a obrigatoriedade em “dar conta” de tantas questões complexas que envolvem a velhice (projetos de vida, doença, perdas), que cabe uma pergunta: Estão preparados os familiares a receberem o idoso, quando numa condição de dependência física e/ou cognitiva?

Embora com uma política que respalde práticas de cuidado, como foi possível expor anteriormente, fica uma lacuna entre o ideal e o real, ao qual encontra-se o possível, parafraseando Henri Lefebvre, em que milhares de famílias recebem a nomeação de insuficientes, quando a idealização de direito que seria de prover cuidados amplos e dedicarem-se de maneira integral a uma dada situação, são impelidas por limitações de programas e serviços (seja na área da saúde ou da assistência) com critérios de inclusão / exclusão que restringem a participação, seja por questões territoriais, econômicas ou ainda de ausência de recurso humano.

Em detrimento disso, muda-se também o conceito de família, considerada pelo IBGE (2014) como: “[…] conjunto de pessoas ligadas por laços de parentesco, dependência doméstica ou normas de convivência (grifo nosso) , que residem na mesma unidade domiciliar ou sozinhas”, ou seja, compreender que a familiaridade, nesse sentido, é estabelecida com relações de apoio mútuo.

1 Texto publicado originalmente em Abril/2017, no Blog Elo Sênior. Disponível também em: <https://www.elosenior.com/single-post/2017/04/24/A-insufici%C3%AAncia-familiar-Reflex%C3%B5es-a-cerca-da-potencialidade-de-seus-membros>.